quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Surreal



Escrevi aqui ontem que, em nada tendo para dizer, estou calado. Logo me sucedeu hoje, tendo tanto para dizer, não o poder fazer!

Decorreu esta manhã uma Reunião Extraordinária da Câmara Municipal de Nisa, mas estipula o Regimento que nas reuniões extraordinárias não há Período de Intervenção dos Munícipes, razão pela qual entrei mudo e sai calado.

Da Ordem de Trabalhos constavam seis pontos. Aquele que me levou à reunião, o ponto nº 4, era a discussão da “Proposta sobre a Tabela de Taxas e Licenças do Município de Nisa”, em particular as tarifas de venda de água, tratamento de águas residuais e recolha e tratamento de resíduos sólidos. Todas estas tarifas são reflectidas num mesmo documento, a factura da água que mensalmente recebemos do Município.

A proposta levada à reunião, apresentada pela Presidente da Câmara, preconizava a manutenção das actuais tarifas, que fundamentou com a apresentação de alguns considerandos. Antes desta proposta ser posta à votação, ainda durante o debate, a Vereadora Fernanda Policarpo apresentou uma outra, do mesmo teor, mas baseada em considerandos diferentes.

Sobre a divergência nos considerandos pronunciar-me-ei mais tarde, logo que tome conhecimento integral dos mesmos.

Voltando à vaca fria: estando todo o executivo de acordo no essencial, naquilo que de facto interessa aos munícipes, os valores das tarifas, algo surreal aconteceu. A Presidente da Câmara recusa aceitar a proposta apresentada pela Vereadora Fernanda Policarpo, com cujo teor os vereadores do PS concordavam, e cito a Vereadora Idalina Trindade, “na íntegra", pondo apenas à votação a sua própria proposta. Procedendo-se à votação, os vereadores da Oposição (continuo a chamar-lhes assim, embora, em boa verdade, não exista oposição “de jure” num executivo camarário, apenas nas assembleias municipais, regionais ou na Assembleia da República) não responderam quando inquiridos se votavam contra, se se abstinham ou votavam a favor. Ou seja, não votaram.

Vamos por partes. De acordo com o já citado Regimento da Câmara, nas reuniões extraordinárias só existe a Ordem do Dia, previamente estipulada. No entanto, segundo o Art.º nº 7, podem ser apresentadas outras propostas para além daquelas que constam da Ordem de Trabalhos, conforme a alínea 3:

 “Até à votação de cada proposta e após deliberada a sua inclusão na “Ordem de Trabalhos”, podem ser apresentadas, sobre o mesmo assunto, propostas escritas e devidamente fundamentadas de facto e de direito.”

Não sou jurista, mas a menos que seja estúpido e burro, parece-me ter havido uma clara violação desta norma por parte da Presidente da Câmara, porquanto a proposta da Vereadora Fernanda Policarpo cumpria o estipulado regimental.

Passemos à não votação, por parte dos vereadores da Oposição, da proposta apresentada pela Presidente. Nada na Lei prevê, presumo que por tão absurda que o legislador a não contemplou no articulado, uma situação como a ocorrida, ou seja a não votação de uma proposta. Os vereadores poderiam ter tomado uma de quatro atitudes, essas sim previstas na Lei: votar contra, a favor, absterem-se ou ausentarem-se da sala. Verificada esta última circunstância a reunião deveria terminar de imediato, por falta de quórum.

O executivo tem a obrigação de votar toda e qualquer proposta que seja levada a uma Reunião de Câmara, seja esta Ordinária ou Extraordinária. Não o querendo fazer, o recurso de abandonar a reunião, ainda que discutível e eventualmente sujeito a sanções, seria o único aceitável.

No presente ano já se realizaram no Município de Nisa 31 Reuniões de Câmara, 20 Reuniões Ordinárias e 11 Extraordinárias, ou seja, cerca de 3 reuniões por mês. Seria de esperar que, com tamanha profusão, perfeitamente descabida, até pelos custos que acarreta aos munícipes, a produção do executivo fosse acima da média, contribuído de forma eficiente e eficaz para o desenvolvimento concelhio. Aquilo a que hoje assisti só veio confirmar o que há algum tempo penso: eficiência e eficácia não fazem parte do léxico do nosso executivo.

Las but not least, tivemos mais uma reunião que terminou de forma abrupta, entre insultos pessoais e linguagem que continuo a considerar ser mais própria de lavadouro público do que de uma reunião do executivo municipal.

No meio disto tudo, lamentando a sorte dos munícipes, lamento sobretudo a sorte da pobre D. Alice, que secretaria as reuniões, e se vê em palpos de aranha para apanhar o fio à meada de modo a poder elaborar as actas.

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